Rede elétrica britânica aposta em volantes para manter as luzes acesas. 31/08/2025
- Ana Cunha-Busch
- há 24 horas
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Por AFP - Agence France Presse
Rede elétrica britânica aposta em volantes para manter as luzes acesas
Akshata KAPOOR
A operadora de energia britânica está apostando em uma tecnologia milenar para preparar sua rede para o futuro, já que as usinas que tradicionalmente ajudaram a estabilizá-la estão sendo fechadas e substituídas por sistemas de energia renovável.
Dispositivos metálicos giratórios, conhecidos como volantes, são usados há séculos para fornecer inércia — resistência a mudanças repentinas de movimento — a diversas máquinas, desde uma roda de oleiro até uma máquina a vapor.
As operadoras de rede agora estão recorrendo à tecnologia para adicionar inércia a sistemas elétricos com grande uso de energia renovável, a fim de evitar apagões como o que atingiu a Espanha e Portugal este ano.
Em uma rede elétrica, a inércia é geralmente fornecida por grandes geradores giratórios encontrados em usinas a carvão e a gás, ajudando a manter uma frequência constante, suavizando as flutuações na oferta e na demanda.
Mas fontes de energia renováveis, como a solar e a eólica, não adicionam inércia à rede e geralmente não ajudam em outras questões, como o controle de tensão.
Volantes de inércia podem imitar a inércia rotacional dos geradores de usinas, girando mais rápido ou mais devagar para responder às flutuações.
Sem turbinas rotativas, "o sistema fica mais sujeito a flutuações do que seria de outra forma", explicou David Brayshaw, professor de ciência climática na Universidade de Reading, na Inglaterra.
"À medida que alcançamos níveis cada vez maiores de energias renováveis, teremos que pensar nisso com mais cuidado", disse Brayshaw à AFP.
- Volantes de inércia e baterias -
A Península Ibérica, que é abastecida por uma grande parcela de energias renováveis, ficou sem energia em 28 de abril, após sua rede elétrica não conseguir absorver um pico repentino de tensão e desvios de frequência.
Desde então, o governo espanhol tem acusado as usinas convencionais por não conseguirem controlar os níveis de tensão.
Isso poderia servir como um alerta semelhante ao apagão de 2019 que deixou partes da Grã-Bretanha na escuridão após uma queda na frequência da rede.
Esse apagão levou a operadora de energia britânica NESO a lançar o que chamou de um programa "pioneiro no mundo" para contratar projetos de estabilização da rede.
Volantes e baterias podem adicionar inércia sintética à rede, mas o professor de engenharia Keith Pullen afirma que volantes de aço podem ser mais econômicos e duráveis do que baterias de íons de lítio.
"Não estou dizendo que volantes sejam a única tecnologia, mas eles podem ser muito, muito importantes", disse Pullen, professor da City St George's, Universidade de Londres e diretor da startup de volantes Levistor.
Nos próximos anos, Pullen alertou que a rede também se tornará mais instável devido à demanda maior, porém mais intensa.
Com carros elétricos, bombas de calor e data centers que consomem muita energia conectados à rede, "teremos mais cargas de choque... que o volante suaviza".
- Inércia sem carbono -
O "Greener Grid Park", da empresa norueguesa Statkraft, em Liverpool, foi um dos projetos contratados pela NESO para manter as luzes acesas.
Em operação desde 2023, fica a poucos passos de uma antiga usina termelétrica a carvão, que pairava sobre a cidade do norte da Inglaterra durante a maior parte do século XX.
Mas agora, em vez de turbinas a vapor, dois volantes gigantes, pesando 40 toneladas (40.000 quilos) cada, giram na Statkraft, que fornece 1% da inércia necessária para a rede elétrica na Inglaterra, Escócia e País de Gales.
Cada volante é acoplado a um compensador síncrono, uma máquina giratória que aumenta ainda mais a inércia e fornece serviços de controle de tensão na região de Liverpool.
"Estamos fornecendo essa inércia sem queimar combustíveis fósseis, sem criar emissões de carbono", disse Guy Nicholson, chefe de soluções de rede elétrica de carbono zero da Statkraft.
De acordo com a NESO, outros 11 projetos semelhantes de compensadores síncronos e volantes de inércia estavam em operação na Grã-Bretanha em 2023, com vários outros contratados.
- "Não é rápido o suficiente" -
O governo está "trabalhando em estreita colaboração com nossos parceiros da indústria que estão desenvolvendo tecnologia de ponta, incluindo volantes de inércia, compensadores estáticos e síncronos, enquanto reformulamos o sistema energético", disse um porta-voz do Departamento de Segurança Energética e Net Zero à AFP.
Mas "não estamos construindo-os com rapidez suficiente para descarbonizar a rede", alertou Nicholson.
A Grã-Bretanha pretende abastecer a rede com energia limpa 95% do tempo até 2030, antes de mudar completamente para energias renováveis na próxima década.
"No momento... não conseguimos fazer isso nem por uma hora", disse Nicholson.
Mesmo quando há energia solar e eólica suficiente sendo gerada, "ainda precisamos operar turbinas a gás para manter a rede estável", explicou.
Ainda assim, a Grã-Bretanha e a vizinha Irlanda parecem estar à frente na aquisição de tecnologia para estabilizar redes com forte presença de energia renovável.
"Na Grã-Bretanha e na Irlanda, os operadores do sistema estão liderando a contratação desses serviços", disse Nicholson. "No continente, não houve o mesmo impulso para isso."
"Acredito que essas coisas são impulsionadas por eventos. Então, o apagão espanhol impulsionará a mudança."
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