O que esperar do Licenciamento Ambiental no Brasil com o PL da Devastação? BRASIL OPINIÃO 15/06/2025
- Ana Cunha-Busch
- 14 de jun.
- 6 min de leitura
Atualizado: 15 de jun.

O que esperar do Licenciamento Ambiental no Brasil com o PL da Devastação?
No ultimo dia 5 de junho de 2025 complemtamos 43 anos após a realização da primeira e mais importante conferência ambiental da ONU. Mas neste ano me senti um pouco incomodada e fiquei me perguntando sobre o que devemos comemorar no dia 5 de junho, o Dia Mundial do Meio Ambiente, no caso do país que resido - Brasil? Após anos de estudo e atuação na área ambiental, percebo que sempre menciono essa conferência em minhas falas - em sala de aula, em debates, etc. Reconheço que ela é um marco importante para a história ambiental, pois nos remete a lembranças de um momento histórico em que a humanidade se uniu em defesa de sua existência e do bem-estar ambiental em resposta aos desastres ambientais que assolavam diversos países.
A culminância da Revolução Industrial, ocorrida no final do século XIX e início do século XX, e o desenvolvimento da urbanização brasileira foram fatores preponderantes para a mudança de mentalidade quanto às relações que precisamos estabelecer com o meio ambiente.
Enquanto espécie, tivemos que dar um passo difícil: reconhecer a existência de uma crise ambiental planetária associada às atividades humanas em suas diversas especificidades - industrial, agrícola e comercial. Mas esse passo trouxe um legado importante para a humanidade.
A primeira conferência ambiental realizada pelas Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano ocorreu em 1972, em Estocolmo, na Suécia. Ela se tornou um marco histórico e abriu caminho para a realização de várias outras conferências mundiais sobre meio ambiente, que, juntamente com a criação de tratados, protocolos e acordos, firmaram o compromisso da humanidade na construção de um ambiente seguro e equilibrado.
Diante disso, podemos ressaltar que um dos seus legados foi a criação de políticas ambientais em todo o mundo. Cabe registrar que, após o Brasil passar por 21 anos em um regime de governo antidemocrático, em 1988, tivemos a oportunidade de conceber uma Constituição da República Federativa, que soube internalizar as preocupações ambientais às quais a população mundial estava atenta.
Assim, nossa Constituição amparou e consolidou a criação de políticas de gestão ambiental por meio de um capítulo dedicado a esse tema, o Capítulo V, que em seu artigo 225 indica a obrigatoriedade do poder público e da coletividade na defesa do meio ambiente ecologicamente equilibrado. Para isso, a CF estabelece a necessidade de realização de estudo prévio de impacto ambiental como requisito para instalação ou operação de obra ou atividade potencialmente causadora de impacto ambiental.
A Carta Magna embasou outros dispositivos legais, que criaram mecanismos aos quais a sociedade deve cumprir para a execução de atividades econômicas, industriais, de serviços, entre outras, a exemplo da Política Nacional de Meio Ambiente (PNMA), criada pela Lei nº 6.938/1981 e algumas Resoluções do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA) nº 001/1986 e 237/1997.
Em todos esses documentos podemos encontrar algo que estende a determinação da necessidade de estudos ambientais anteriores à execução de atividades humanas que tenham significativo potencial de impacto ambiental.
A Lei nº 6.938/1981 estabelece, em seu artigo 9º, a “avaliação de impactos ambientais e o licenciamento e a revisão de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras” como instrumentos para o alcance da preservação e a recuperação da qualidade ambiental.
Na sequência, a Resolução nº 1/1986 estabelece os critérios e procedimentos da Avaliação de Impactos Ambientais no Brasil e, após 11 anos da sua existência, o CONAMA publica a Resolução nº 237/1997, que vincula a Avaliação dos Impactos Ambientais com o Licenciamento Ambiental.
Os três dispositivos supracitados estão fundamentados pela Constituição Federal, e, juntos, criam um arcabouço legal essencial para a garantia dos direitos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. São, portanto, ferramentas essenciais para o ordenamento das atividades econômicas e para a promoção da sustentabilidade ambiental.
Em termos práticos, a legislação ambiental brasileira atual equipa os órgãos ambientais para que o licenciamento ambiental seja eficaz no controle das atividades causadoras de impacto ambiental, uma vez que requer a realização de estudos ambientais e elaboração de planos para a gestão dos impactos ambientais.
Esses estudos carregam dados ambientais importantíssimos para o conhecimento do ambiente e sua reação mediante os impactos causados pelas atividades humanas, capazes de fornecer uma base para a elaboração de medidas mitigadoras ou compensatórias dos impactos ambientais.
Contudo, os ganhos ambientais adquiridos outrora, após o processo de redemocratização brasileira, estão em pauta no congresso federal brasileiro e sendo alvo de revisões quanto à sua obrigatoriedade. Esse é o caso do que a legislação ambiental brasileira determina para o licenciamento ambiental, e o Projeto de Lei (PL) nº 2.159/2021 é um exemplo clássico do afrouxamento legal quanto às questões ambientais, que muitas vezes ocorre em um ambiente de forte crítica às restrições ambientais impostas pela legislação brasileira.
O PL traz à tona antigos anseios, que aparentemente foram suplantados pela tomada de consciência ambiental por parte de uma sociedade mais conhecedora dos seus direitos e deveres. Ele se propõe a regulamentar o inciso IV da Constituição Federal sobre a obrigatoriedade de exigência de estudo prévio de impacto ambiental para a execução de atividades antrópicas. Mas também altera dispositivos importantes como a Lei de Crimes Ambientais (nº 9.605/1998) e a Lei que dispõe sobre o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (nº 9.985/2000).
Embora seja importante a criação de uma lei que regulamente o licenciamento ambiental, é necessário respeitar a constitucionalidade das leis anteriores e reforçar os critérios de obtenção da Licença Ambiental.
Dado esse entendimento, há que observar que o PL 2.159/2021, apelidado como “PL da Devastação”, traz uma série de itens que flexibilizam significativamente os dispositivos legais relacionados ao licenciamento ambiental e à aplicação da Lei de Crimes Ambientais.
O PL preza, entre outras coisas, pela celeridade e economia processual. E para isso, estipula que a licença ambiental poderá ocorrer, inclusive, em uma única fase, ou ainda por meio da adesão voluntária do empreendedor, por meio de autodeclaração, sem necessariamente respeitar a análise individualizada de cada licença — ambas conhecidas como Licença por Adesão e Compromisso (LAC) e Licença Ambiental Única (LAU).
Outro item que chama a atenção é a isenção do licenciamento ambiental de determinadas atividades, incluindo atividades de ordem de serviços de utilidade pública ou ligadas à promoção do saneamento básico. Além disso, o PL também determina a desvinculação da outorga e do uso e parcelamento do solo do processo de licenciamento ambiental.
Ele adentra também na autonomia e competência dos órgãos ambientais brasileiros ao propor que o empreendedor possa requerer o ajuste do termo de referência, que se trata de um documento elaborado pelo órgão ambiental com o objetivo de especificar os conteúdos que deverão ser apresentados nos estudos ambientais.
Um ponto bastante enfatizado no PL é a criação de prazos máximos para a obtenção das licenças ambientais, o que atende ao que o próprio PL determina acerca da celeridade desses processos. De acordo com uma consulta realizada no documento público no site do Senado, o prazo máximo para a obtenção da licença ambiental corresponde a 10 (dez) meses, se for licença prévia com exigência de Estudo de Impacto Ambiental (EIA). Para alguns, esse parece um bom tempo para a obtenção de uma licença ambiental. Mas devemos refletir sobre a possibilidade de realização de um estudo com tal caráter de complexidade como o EIA, em menos de 10 meses.
E diante de tantas mudanças, o assunto vem à tona, como uma preocupação pública. Muitas organizações e instituições se pronunciaram contrárias ao PL, assim como a própria Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, que utilizou meios de comunicação para destacar sua preocupação frente aos retrocessos que esse PL representa à legislação brasileira.
No fim, para comemorar o Dia Mundial do Meio Ambiente no Brasil, é fundamental lembrar que, embora nossa legislação contemple de forma satisfatória a manutenção dos processos ambientais, ainda estamos sujeitos a ações danosas. Um exemplo disso são os desastres ambientais que acometeram o país em 2015 e 2019, devido ao rompimento de barragens de rejeitos de mineradoras localizadas em Mariana e Brumadinho, em Minas Gerais, respectivamente.
Neste Dia Mundial do Meio Ambiente, precisamos responder a alguns questionamentos urgentes: o que podemos esperar do Brasil em um cenário no qual esse PL seja aprovado? E, principalmente: o que podemos fazer para combater os retrocessos aos quais a legislação ambiental está sujeita?
Que neste dia possamos relembrar nossa história — e, mais ainda, fortalecer nossa luta por uma nação mais justa e igualitária, onde as instituições exerçam com eficácia as políticas ambientais, em pleno respeito à Constituição Federal.
Abraços ambientais!
ODS: 16: Paz, Justiça e Instituições Eficazes





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